O nome “pais apostólicos” tem sua origem na Igreja do Ocidente do século II.
São chamados de “pais apostólicos” os homens que tiveram contato direto com
os apóstolos ou, então, foram citados por alguns deles. Destacam-se entre os
indivíduos que regularmente recebem esse título, Clemente de Roma, Inácio e
Policarpo, principalmente este último, pois existem evidências precisas de
que ele teve contato direto com os apóstolos.
Clemente de Roma (30-100)
Várias hipóteses já foram levantadas sobre Clemente para identificá-lo. Para
alguns, ele pertencia à família real. Para outros, ele era colaborador do
apóstolo Paulo. Outros ainda sugeriram que ele escreveu a carta aos Hebreus.
Em verdade, as informações a respeito de Clemente de Roma vão desde lendárias
a testemunhas fidedignas. Alguns pais, como Orígenes, Eusébio de Cesaréia,
Jerônimo, Irineu de Lião, entre outros, aceitaram como verdadeira a
identificação de Clemente de Roma como colaborador do apóstolo Paulo.
A principal obra de Clemente de Roma é uma carta redigida em grego,
endereçada aos crentes da cidade de Corinto, mais ou menos no final do
reinado de Domiciano (81-96) ou no começo do reino de Nerva (96-98). A
epístola trata, principalmente, da ordem e da paz na Igreja. Seu conteúdo traz
à tona o fato de os crentes formarem um corpo em Cristo, logo deve reinar
nesse corpo a unidade, e não a desordem, pois Deus deseja a ordem em suas
alianças. Traz, ainda, a analogia da adoração ordeira do Antigo Israel e do
princípio apostólico de apontar uma continuidade de homens de boa reputação.
Inácio de Antioquia (??-117)
Mesmo sendo de Antioquia, seu nome, Ignacius, deriva-se do latim: igne:
“fogo”, e natus: “nascido”.
Conforme seu nome sugere, Inácio era um homem nascido do fogo, ardente, apaixonado
por Cristo. Segundo Eusébio, após a morte de Evódio, que teria sido o
primeiro bispo de Antioquia, Inácio fora nomeado o segundo bispo dessa
influente cidade.
Inácio escreveu algumas epístolas às comunidades cristãs asiáticas: à igreja
de Éfeso, às igrejas de Magnésia, situada no Meander, à igreja de Trales, às
igrejas de Filadélfia e Esmirna e, por fim, à igreja de Roma. O objetivo da
carta a Roma era solicitar que os irmãos não impedissem seu martírio, o que
aconteceria durante o reinado de Trajano (98-117).
Antioquia
Foi fundada por volta do ano 300 a.C., por Seleuco Nicátor, com o nome de
Antiokkeia, (cidade de Antíoco). Tornou-se capital do império selêucida e
grande centro do Oriente helenístico. Conquistada pelos romanos por volta do
ano 64 a.C., conservou seu estatuto de cidade livre e foi a terceira cidade
do Império depois de Roma e Alexandria (no Egito), chegando a abrigar 500 mil
habitantes. Evangelizada pelos apóstolos Pedro, Paulo e Barnabé, tornou-se
metrópole religiosa, sede de um patriarcado e centro de numerosas
controvérsias, entre elas, o arianismo, o monofisismo, o nestorianismo. Era
considerada a igreja-mãe do Oriente.
Policarpo (69-159)
Sobre sua infância, família e formação, não temos informações precisas,
contudo há documentos históricos sobre ele. Graças a alguns testemunhos
fidedignos, podemos reconstruir sua personalidade. Foi discípulo do apóstolo
João, amigo e mestre de Irineu, tendo ainda conhecido Inácio, sendo
consagrado bispo da igreja de Esmirna. Quanto aos seus escritos, o único que
restou desse antigo pai da igreja foi a sua epístola aos filipenses,
exortando-os a uma vida virtuosa de boas obras e a permanecerem firmes na fé
em nosso Senhor Jesus Cristo. Seu estilo é informal, com muitas citações do
Velho e do Novo Testamentos.
Faz, ainda, 34 citações do apóstolo Paulo, evidenciando que conhecia bem a
carta desse apóstolo aos filipenses, entre outras epístolas de Paulo. Há,
também, os depoimentos de Eusébio e Irineu, relatando a intimidade de
Policarpo com testemunhas oculares do evangelho. Segundo Tertuliano,
Policarpo teria sido ordenado bispo pelas mãos do próprio apóstolo João.
O martírio de Policarpo
O martírio de Policarpo é descrito um ano depois de sua morte, em uma carta
enviada pela Igreja de Esmirna à Igreja de Filomélio. Esse registro é o mais
antigo martirológio cristão existente. Diz a história que o procônsul romano,
Antonino Pius, e as autoridades civis tentaram persuadi-lo a abandonar sua
fé, quando já avançado em idade, para que pudesse ser livre.
Ele, entretanto, respondeu com autoridade: “Eu tenho servido a Cristo por 86
anos e ele nunca me fez nada de mal. Como posso blasfemar contra meu Rei que
me salvou? Eu sou um crente!”.
Justino, o mártir (100-170)
Flávio Justino Mártir nasceu em Siquém, na Palestina, no início do segundo
século e morreu mártir no ano 170. Depois de peregrinar pelas mais diversas
escolas filosóficas (peripatética, estóica e pitagórica) em busca da verdade
para a solução do problema da vida, abandonou o platonismo, último estágio de
sua peregrinação filosófica. O amor à verdade fez que ele rejeitasse, pouco a
pouco, os sistemas filosóficos pagãos e se convertesse ao cristianismo. Em
sua época, foi o mais ilustre defensor das verdades cristãs contra os
preconceitos pagãos.
Embora leigo, é considerado o primeiro “pai apologista” da Igreja, logo
depois dos primitivos “pais apostólicos”, pois dedicou sua vida à difusão e
ao ensino do cristianismo. Em Roma, abriu uma escola para o ensino da
doutrina cristã e, ainda nessa cidade, dedicou-se ao apostolado,
especialmente nos meios cultos, onde se movimentava com desembaraço. Escreveu
muitas obras, mas somente três chegaram até nós: duas apologias contra os
pagãos e um diálogo com o judeu Trifão.
Foi açoitado e, depois, decapitado.
Irineu (130-200)
Nascido no ano 130, em Esmirna, na Ásia Menor (Turquia), e filho de uma
família cristã, Irineu era grego e foi influenciado pela pregação de
Policarpo, bispo daquela cidade. Anos depois, Irineu mudou-se para Gália
(atual sul da França), para a cidade de Lyon, onde foi presbítero no lugar do
bispo que havia sido martirizado em 177.
Além da pregação de Policarpo, Irineu recebeu influência de Justino, cujo
ministério foi um elo entre a teologia grega e a latina, atuando, no início,
junto com um de seus contemporâneos, Tertuliano.
Enquanto Justino era primariamente um apologista, Irineu contribuiu na
refutação contra as heresias e na exposição do cristianismo apostólico. Sua
maior obra foi desenvolvida no campo da literatura polêmica contra o
gnosticismo.
Tertuliano de Cartago (150-230)
Nasceu por volta de 150 d.C., em Cartago (cidade ao nordeste da África), onde
provavelmente passou toda a sua vida, embora alguns estudiosos afirmem que
ele morasse em Roma. Por profissão, sabe-se que era advogado. Fazia visitas
com freqüência a Roma, sendo que, aos 40 anos, se converteu ao cristianismo,
dedicando seus conhecimentos e habilidades jurídicas ao esclarecimento da fé
cristã ortodoxa contra os pagãos e os hereges.
Foi o pai das doutrinas ortodoxas da Trindade e da pessoa de Jesus Cristo.
Suas doutrinas a respeito da Trindade e da pessoa de Cristo foram forjadas no
calor da controvérsia com Práxeas que, segundo Tertuliano, “sustenta que
existe um só Senhor, o Todo-Poderoso criador do mundo, apenas para poder
elaborar uma heresia com a doutrina da unidade. Ele afirma que o próprio Pai
desceu para dentro da virgem, que Ele mesmo nasceu dela, que Ele mesmo sofreu
e que, realmente, era o próprio Jesus Cristo”.
Tertuliano foi o primeiro teólogo cristão a confrontar e a rejeitar com
grande vigor e clareza intelectual essa visão aparentemente singela da
Trindade e da unidade de Deus. Ele declarou que se esse conceito fosse
verdade, então o Pai tinha morrido na cruz, e isso, além de ser impróprio
para o Pai, é absurdo.
Orígenes (185-254)
Nasceu de pais cristãos em 185 ou 186 da nossa era, provavelmente em
Alexandria. Era escritor cristão de vasta erudição, de expressão grega e,
inicialmente, com ação em sua cidade natal. Estudou letras e aprendeu de cor
textos bíblicos com seu pai, que foi morto por ocasião da repressão do
imperador Sétimo Severo às novas religiões.
O bispo de Alexandria passou a Orígenes a direção da Escola Catequética,
sendo então sucessor de Clemente. Estudou na escola neoplatônica de “Ammonios”.
Viajou a Roma, em 212, onde ouviu ao sábio cristão Hipólito. Em 215,
organizou em Alexandria uma escola superior de Exegese Bíblica. Devido ao seu
vasto conhecimento, viajava muito e ministrava ao público nas igrejas.
O fato de se haver castrado por devoção lhe criou dificuldades com alguns
bispos, que contrariavam o sacerdócio dos eunucos. Em 232, transferiu-se para
Cesaréia, na Palestina, onde se dedicou exaustivamente aos seus estudos.
Sobreviveu aos tormentos de que foi vítima sob o domínio do imperador Décio
(250-252). Posteriormente a esta data, morreu em Tiro, não se sabendo
exatamente quando.
Era considerado o membro mais eminente da escola de Alexandria e estudioso
dos filósofos gregos. Acreditava que a alma preexiste e está subordinada à
metempsicose. Aqui vemos nele uma tese tipicamente pitagórica e platônica,
sendo abandonada depois pelo cristianismo oficial. Todavia, é relembrada
ainda hoje por aqueles que a defendem como doutrina cristã: os espíritas.
Origem da palavra cânon
A palavra cânon vem do assírio “Qânu”. É usada 61 vezes no Antigo Testamento,
sempre em seu sentido literal, que significa “cana”, “balança”. O primeiro a
usar esse termo foi Orígenes, para se referir à coleção de livros sagrados,
que eram ou serviam de regra e fé para o ensino cristão.
Cipriano (200-258)
Tharsius Caecilius Cyprianus. Converteu-se em 246 d.C. e, três anos depois,
foi nomeado bispo de Cartago, no norte da África.
Durante dez anos, conduziu seu rebanho sob a perseguição do imperador Décio,
uma das mais cruéis. Foi também o grande sustentáculo moral e espiritual da
cidade de Cartago no período em que esta foi atacada por uma epidemia. Além
disso, escreveu e batalhou pela unidade da Igreja.
Seu nome está ligado a uma grande controvérsia a respeito do batismo e da
ordenação efetuada por hereges. No entender de Cipriano, essas cerimônias não
valiam, pelo fato de os oficiantes estarem em desacordo com a ortodoxia.
Assim, deveriam ser rebatizados e reordenados todos os que entrassem pela
verdadeira Igreja. Estêvão, bispo de Roma, discordou com ele e isso gerou um
cisma, uma vez que Cipriano, além de rejeitar a autoridade do bispo romano,
convocou um concílio no norte da África para resolver a questão.
Seus escritos consistem em tratados de caráter pastoral e de cartas, 82 ao
todo, das quais 14 eram dirigidas a ele mesmo e as restantes tratavam de
questões de sua época.
Como mártir, morreu decapitado em 14 de setembro de 258 d.C, durante a
perseguição do imperador Valeriano
Eusébio de Cesáreia (265-339)
Incentivado por Constantino, Eusébio fez a narração da primeira história do
cristianismo, coroando-a com a sua imperial adesão a Cristo. “A ortodoxia era
apenas uma das várias formas de cristianismo, durante o século III, e pode só
ter se tornado dominante no tempo de Eusébio” (JOHNSON, 2001: 69).
Cesaréia
Fundada pelo rei Herodes no século I a.C. em um porto comercial fenício e
grego denominado Torre de Straton, Cesaréia foi assim denominada pelo monarca
em homenagem ao imperador romano César Augusto.
A cidade foi detalhadamente descrita pelo historiador judeu Flávio Josefo.
Era uma cidade murada, com o maior porto na costa oriental do Mediterrâneo
chamado “Sebastos”, nome grego do imperador Augusto.
Jerônimo (325-378)
Erudito das Escrituras e tradutor da Bíblia para o latim. Sua tradução,
conhecida como a Vulgata, ou Bíblia do Povo, foi amplamente utilizada nos
séculos posteriores como compêndio para o estudo da língua latina, assim como
para o estudo das Escrituras.
Nascido por volta do ano 345 em Aquiléia (Veneza), extremo norte do Mar
Adriático, na Itália, Jerônimo passou a maior parte da sua juventude em Roma,
estudando línguas e filosofia. Apesar de a história não relatar pormenores de
sua conversão, sabe-se, porém, que ele foi batizado quando tinha entre 19 e
20 anos. Depois disso, ele embarcou em uma peregrinação pelo Império que
levou vinte anos.
Crisóstomo (344-407)
Criado em Antioquia, seus grandes dotes de graça e eloqüência, como pregador,
levaram-no a ser chamado a Constantinopla, onde se tornou patriarca (ou
arcebispo). Como os outros apologistas, harmonizou o ensinamento cristão com
a erudição grega, dando novos significados cristãos a antigos termos
filosóficos, como a caridade.
Em seus sermões, defendia uma moralidade que não fizesse qualquer
transigência com a conveniência e a paixão, e uma caridade que conduzisse
todos os cristãos a uma vida apostólica de devoção e de pobreza comunal. Essa
piedosa mensagem, entretanto, tornou-o impopular na corte imperial, e também
entre alguns membros do clero de Constantinopla, por isso acabou sendo banido
e morreu no exílio.
Agostinho (354-430)
Aurélio Agostinho nasceu no ano de 354, na cidade de Tagaste de Numídia,
província romana ao norte da África, atual região da Argélia. Agostinho
iniciou seus estudos em sua cidade natal, seguindo depois para Cartago.
Ensinou retórica e gramática, tanto no Norte da África como na Itália. Ficou
conhecido como o filósofo e teólogo de Hipona. Polemista capaz, pregador de
talento, administrador episcopal competente e teólogo notável, criou uma
filosofia cristã da história que continua válida até hoje em sua essência.
Inspirado no tratado filosófico denominado “Hortensius”, de Cícero,
converteu-se em ardoroso pesquisador da verdade, abraçando o maniqueísmo. Com
vinte anos, perdeu o pai e tornou-se o responsável pelo sustento da família.
Ao resolver que iria para Roma, sua mãe foi contra, então teve de enganá-la
na hora da viagem. De Roma, foi para Milão, onde novamente passou a lecionar
retórica.
Influenciado pelos estóicos, por Platão e pelo neoplatonismo, também estava
entre os adeptos do ceticismo. Em Milão, porém, conheceu Ambrósio, que o
converteu ao cristianismo. Depois disso, voltou ao norte da África, onde foi
ordenado sacerdote e, mais tarde, consagrado bispo de Hipona. Combateu a
heresia maniqueísta que antes defendia e participou de dois grandes conflitos
religiosos: o Donatismo e o Pelagianismo. Sua obra mais conhecida é a
autobiografia “Confissões”, escrita, possivelmente, no ano 400. Em “A cidade
de Deus” (413-426) formulou uma filosofia teológica da história.
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terça-feira, 17 de janeiro de 2012
OS PAIS APOSTÓLICOS
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