terça-feira, 5 de fevereiro de 2013
Silas Malafaia: o Macunaíma evangélico
No clássico Macunaíma, de Mário de Andrade, o Brasil conheceu a figura do herói sem caráter. Todos os povos gostam de ter seus heróis. Todos os grupos acham importantes as figuras dos heróis. Mas as minorias (ou aqueles que se julgam minorias) necessitam de heróis.
O povo evangélico, acostumado e já tendo assimilado a figura histórica de minoria no Brasil, não é diferente. Carece de heróis à medida que angaria, no decorrer de sua história, inimigos.
A figura do inimigo faz parte do modus vivendi evangélico desde sua chegada ao país (falo do contexto brasileiro, sem ignorar que isso não é privilégio nosso). Sempre precisamos deles. Quando aqui chegamos, os inimigos eram os católicos. Eram eles os inimigos da fé, aqueles que precisavam ser convertidos. Como fumavam, bebiam, frequentavam clubes, cinemas, casas de dança, a prática conversionista evangélica tratou de demonizar todas essas atividades (esquecendo que grande parte das missões evangélicas eram sustentadas pelas volumosas ofertas de plantadores de fumo da região do Texas/EUA). Até hoje carregamos traços desse momento histórico.
Outro inimigo voraz foi o comunismo. É óbvio que assim seria. A ética protestante no início do século XIX foi fortemente influenciada e influenciadora (num movimento de retroalimentação) do capitalismo que varreu o ocidente. Era preciso combater esse grande inimigo, perseguidor dos cristãos e favorecedor da ideologia ateia. Sem entrar no mérito da questão, só vale aqui dizer que, durante muitos anos, esse foi o inimigo a ser vencido. Livros e livros foram escritos sobre essa realidade, e aqueles que manifestassem qualquer tipo de pensamento de “esquerda” já eram tachados de comunistas e, muitas vezes, de satanistas.
Durante quase cem anos de presença protestante no Brasil os inimigos foram os católicos e os comunistas, até explodirem os movimentos pentecostais e suas vertentes de Batalha Espiritual. A essência belicosa protestante aflorou, agora nas regiões “celestiais” e os inimigos de carne e osso ganharam aliados “invisíveis” e as teorias de conspiração dominaram o pensamento evangélico. Nessa onda vieram os discos rodados ao contrário para se ouvirem mensagens satânicas, os filmes da Disney como fomentadores de destruição através de suas diabólicas mensagens subliminares e o movimento denominado Nova Era. Criou-se, desde então (e muitos ainda vivem nisso) uma neurose evangélica com tudo aquilo que faz sucesso, procurando as coisas ocultas e malévolas presentes em tudo. Paranóicos, muitos isolaram-se até mesmo de seus grupos cristãos, pois começaram a ver demônios em tudo.
Toda essa enorme introdução faz-se necessária para que entendamos o que está por trás do sucesso de nosso Macunaíma Malafaia: Nossa alma belicosa e nossa necessidade de heróis.
Malafaia não é bobo! Sabe dessa nossa sede de guerra (o nosso GENERAL é Cristo, lembram?), sabe da necessidade que toda “minoria” tem de ter aqueles que enfrentam os gigantes (transformando Davi na melhor alegoria das lutas contra os grandes e poderosos), sabe, como psicólogo, o quanto a mente infantil precisa de defensores, já que não sabe caminhar por adversidades.
Pois Silas Malafaia, o nosso “herói sem caráter”, assumiu, e bem, esse papel.
Dono de uma oratória inflamada, o verborrágico líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo (denominação criada por ele numa divisão estrategicamente arquitetada) vestiu a capa de defensor da minoria evangélica (já nem tão minoria assim) e, quixotescamente, elegeu os homossexuais como seus moinhos de vento a serem destruídos.
Como os evangélicos precisam de heróis e tem uma relação com a sexualidade doentia e castradora, nosso Macunaíma encontrou terreno fértil para suas investidas e para angariar investidores. Claro! Nosso povo é capaz de doar o que não tem para alguém que vá defender a fé, tão atacada pelos nossos inimigos.
O personagem de Mário de Andrade, mentiroso, ardiloso, matreiro, fazia de tudo para alcançar o seu objetivo: a pedra Muiraquitã, presente de sua mulher e que, para ele, tinha propriedades mágicas.
Silas Malafaia tem sua Muiraquitã: o dinheiro! Isso fica bem claro a cada nova invenção para arrecadar ofertas. Desde bíblias de R$ 900,00 até a promessa de bênçãos materiais àqueles que ofertarem ao seu “singelo” ministério.
Malafaia representa, infelizmente, parte do pensamento evangélico brasileiro. A pior parte! Mas representa.
Malafaia representa o pensamento evangélico ainda belicoso, necessitando de inimigos e vociferando contra estes toda sorte de versículos bíblicos condenatórios, pois a Bíblia é a nossa arma, nossa metralhadora contra Satanás.
Malafaia representa a ganância evangélica pelo poder. Assume claramente que, apesar de não ser político, quer trafegar entre eles e influenciá-los. Sua sede de poder é latente, gritante. E, claro, celebrada pelo povo que “descobriu” que não pode mais ser “cauda”, tem que ser “cabeça”, nem que pra isso perca a cabeça e a “cauda”…
Malafaia é contraditório e “pilantra”! Porque, se conhece a palavra como diz conhecer, sabe que o que fala e promete é uma contradição. E, contradizendo-se, abusa, de má-fé, da boa fé das pessoas que acreditam nele, logo, é “pilantra”! E não sou eu quem o diz, é ele mesmo, em um vídeo antigo (da época em que ainda tinha bigodes e não tinha feito implante capilar) onde afirma categoricamente que “pastor que promete benção material em troca de ofertas é pilantra, é safado.”
Malafaia representa a ignorância do povo que, após crescer desordenadamente, se acha no direito de legislar e impor suas doutrinas e convicções a um Estado, composto de pessoas das mais variadas formações e tendências religiosas. Dane-se! O “deus verdadeiro” tem que ser empurrado goela abaixo daqueles que por anos o rejeitaram. Esse é o castigo por zombarem de Deus (fora o inferno que os aguarda, na “outra vida”).
Malafaia representa o ódio dos evangélicos por aqueles que não se enquadram em suas leis e dogmas. Suas palavras carregadas de preconceito e raiva, exalam algo que, nem de longe, faz lembrar a doçura e a mansidão do Mestre de Nazaré.
Malafaia é o herói que o povo evangélico quer… belicoso… ganancioso… brigão… vociferante… “corajoso”… mas é o herói sem caráter pois veste essa capa exatamente para ter em troca sua Muiraquitã… a grana que sustenta seus sonhos nababescos e extravagantes.
O povo vibra com a “coragem” de seu herói… que bate em quem for preciso, mesmo que depois procure espaço no “inimigo” (a Globo taí pra mostrar…). Não é raro ouvir a seu respeito: “não gosto dele, mas ele tem coragem de peitar todo mundo”. Quando ouço isso penso: “ele conseguiu! Vendeu a imagem de herói! E compraram a imagem vendida!” Para explorar o povo depois dessa imagem construída é um passo muito pequeno… e fácil!
Malafaia usa o pior dos ardis de um enganador: usar a verdade para mentir. Ele dispara sua metralhadora de versículos bíblicos e leva o povo belicoso, que adora ver o inimigo “metralhado”, ao delírio, certo de que, finalmente, surgiu alguém com coragem para enfrentar os “incircuncisos”…
Sei que muitos dirão: você está julgando! Não! Estou apenas apontando as ardilosas artimanhas desse senhor que se arroga representantes do povo evangélico brasileiro. Tire você mesmo as suas conclusões.
Minha esperança é que os olhos sejam abertos e a gana evangélica por heróis e inimigos seja expulsa de nós em nome de um amor que é capaz de amar os inimigos. E falo de Malafaia como um inimigo do Evangelho, que deve ser denunciado, mas amado… por mais difícil que seja. E por impossível que pareça, ainda creio que um dia ele possa se arrepender das negociatas em nome de Deus, e, como Zaqueu (não o da música, mas o da narrativa bíblica) devolver aos pobres aquilo que lhes foi roubado em nome de “Deus”.
Por enquanto, fico com a imagem de Macunaíma, o herói sem caráter… hoje, triste metáfora daquele que quer, por força, representar o nosso povo que se diz “povo de Deus”.
Com tristeza,
José Barbosa Junior – São Paulo – 04/02/2013
Fonte: http://www.crerepensar.com.br
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Fantástica reflexão.
ResponderExcluirParabéns. É o mínimo que posso dizer.
ResponderExcluirObrigado, pela reflexão
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